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Página específica para a 3ª edição do curso de especialização em Gestão Pública e Sociedade:

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Ecologia e Desenvolvimento: armadilhas, riscos e oportunidades



Onde está a VIDA que perdemos em vida?
Onde está a sabedoria que perdemos com o conhecimento?
Onde está o conhecimento que perdemos com a informação
?”
The Roch. Faber Edition London, 1961

É no mínimo preocupante quando a idéia de que - a preservação ambiental é obstáculo para o desenvolvimento do Brasil - ganha cada vez mais apelo e visibilidade.

Trata-se de um falso dilema, isso porque obviamente é o homem que precisa da natureza, e não o contrário. Manter, ou se preferirem, sustentar os ciclos ecológicos, significa manter a possibilidade de vida humana. Logo, o que está em jogo é precisamente o tipo ou a qualidade de desenvolvimento de que estamos falando.

A atual forma de sociedade ou civilidade predominante foi constituída, ao longo de alguns séculos, motivada ou centrada especialmente na riqueza material. Para se viabilizar tal lógica de desenvolvimento, criaram-se algumas estruturas básicas.

Com isso, uma vez definido o macro-objetivo de ganho material imediato e sempre crescente, formou-se um determinado processo de acumulação de riquezas, que traz consigo, necessariamente, duas conseqüências diretas: (1) ele é um objetivo divergente, ou seja, materialmente é possível apenas algumas poucas pessoas concentrar e acumular riquezas, e (2) direciona-se as descobertas e inovações científicas e tecnológicas para se acelerar a produção de mercadorias, mesmo que tal produção não acompanhe, efetivamente, as necessidades agregadas de uma sociedade.

Como resultado, temos a configuração, por um lado, da exploração do trabalho, que se materializa em pobreza e exclusão material de parte expressiva da humanidade, e por outro lado, na formação de processos produtivos e parques industriais “programados” a acelerar a produção indubitavelmente, ou seja, a finalidade não é o valor de uso - aquilo que realmente é necessário para melhorar as condições de vida das pessoas, inclusive tempo livre e lazer, mas apenas o consumo sempre crescente. Para manter em ascendência tal curva de consumo, e esse é um ponto essencial desta lógica, também se reduz, drasticamente, a vida útil das mercadorias produzidas, aumentando-se o desperdício, ou seja, novas necessidades artificiais de consumo.

Logo, enquanto que isoladamente têm-se ganhos crescentes de produtividade e eficiência, traduzidos em produzir mais coisas com menos tempo, no conjunto temos na realidade ganhos decrescentes de produtividade e efetividade. Isso porque há uma substituição crítica ou inversão de prioridades, pois o trabalho disponível e o aparato tecnológico de produção não são direcionados, progressivamente, para outras demandas sociais, tais como a redução do tempo de trabalho necessário, eficiência energética e de mobilidade, melhores condições de vida, enriquecimento cultural e intelectual, mas sim para a mera, desnecessária e irracional reposição incessante de mercadorias (muitas das quais de utilidade duvidosa, como o setor de luxo) além dos custos crescentes com o equacionamento dos passivos ou externalidades negativas criadas (lixo, caos urbano, doenças e epidemias, encarecimento dos meios de transporte, violência, erosão e contaminação dos solos, ineficiências energéticas, entre outros), dito de outra forma, um colossal desperdício sistêmico.
Os países do capitalismo originário puderam se beneficiar, até certo ponto, deste tipo de desenvolvimento, pois obviamente para a ascensão da industrialização havia a disponibilidade de uma grande capacidade de carga do planeta, além de imensos territórios para se colonizar ou explorar.

Entretanto, iniciamos o século XXI em outro contexto, pois enquanto a tragédia social já é um fato indiscutível, tal modo de se produzir, centrado numa velocidade ainda maior de destruição, começa a encontrar limites físicos para a sua expansão, que é justamente a própria capacidade de carga do planeta Terra, tanto do ponto de vista dos recursos naturais disponíveis, como especialmente na capacidade de processas ou “reciclar” os imensos passivos ambientais e ecológicos criados.

As opções são claras: continuidade no desenvolvimento baseado no capital ou inovação societal.
Optar pelo mesmo tipo de desenvolvimento, baseado na exploração incessante sobre os recursos naturais e sobre o trabalho, poderá no médio prazo trazer crescimento econômico e ganhos materiais para o Brasil, mas aqui está a grande armadilha.
Isso pelo fato de que, obviamente, alguns segmentos enriqueceram mais, enquanto outras camadas sociais aproveitaram tão somente os respingos dessa suposta prosperidade. Mas no longo prazo, além de se esgotarem os mecanismos artificiais de se “acelerar” o crescimento (como o crédito), seus efeitos “colaterais” não tardarão de se manifestar, em diferentes perspectivas, a saber:

1) Estando a floresta amazônica em grande medida destruída, teremos uma sobrecarga fatal de lançamento dos gases do efeito estufa na atmosfera, colocando o Brasil lado a lado dos demais países responsáveis por essa tragédia climática, de efeitos ainda imprevisíveis sobre toda a humanidade;
2) Com a destruição de parte expressiva da floresta, também será afetado o ciclo de chuvas na região centro sul do país, com amargos prejuízos na agricultura.
3) Ao perder controle sobre o desmatamento e o domínio sobre o território, abre-se um perigoso precedente para a intervenção bélica internacional, sob o argumento de defesa da natureza, mas motivado principalmente pela busca dos seus recursos, afinal, estamos no mesmo “jogo” realizado pelas grandes potências econômicas (que obviamente apelaram muitas vezes para o uso da força).
4) Quando for saturado o crescimento baseado no crédito e nas exportações, haverá refluxo nas taxas de emprego e ocupação profissional, sem falar dos outros problemas avindos com o caos urbano, degradação do ar e das águas, ou seja, os exatos problemas enfrentados pelas nações consideradas “ricas”.
5) Na hipótese de investimentos externos contínuos, temos ainda dois efeitos a se considerar, aumento da remessa de lucros e incremento contínuo de tecnologias poupadoras da mercadoria trabalho, ou seja, os empregos são destruídos numa velocidade maior do que são criados.
Outro caminho seria inovar na forma e na lógica de se gerar riqueza. No curto prazo há grandes riscos, pois o crescimento econômico pode inclusive ser freado, afetando expectativas mais imediatistas de conforto material, mas no longo prazo, os benefícios e oportunidades são ilimitados.

Pensar no desenvolvimento de longo prazo e baseando no bem estar das pessoas e uso sustentável dos recursos naturais, requer decisões firmes e cruciais no momento presente.
Nessa perspectiva, há muitas questões a serem tratadas, como o planejamento territorial da região norte, matriz energética, tecnologia e produção, entre outros.

Apenas para ilustrar, não é difícil imaginar um caminho estratégico razoável. Por um lado redirecionar os imensos recursos, hoje canalizados para grandes obras de infra-estrutura (com questionáveis benefícios), e optar primeiro pela pesquisa, desenvolvimento e disseminação de alternativas de energia, transporte, moradia e eficiência energética. No imediato o crescimento econômico pode ser até nulo, mas aos poucos haverá naturalmente uma redução exponencial no desperdício, na obsolescência de mercadorias, e uma nova equação produção VS consumo, ou seja, com o mesmo produto industrial cria-se um estoque de riquezas maior ou crescente. No médio prazo, como não há novos custos com passivos ambientais, pode-se priorizar o setor de biotecnologia, com a perspectiva de novos valores conhecimentos e produtos. Já no longo prazo, além de manter os ciclos ecológicos vitais, haverá maior estoque de riqueza, distribuída e potencializada, junto com novas oportunidades de conforto material e espiritual, inclusive a necessária redução do tempo de trabalho socialmente necessário.

Numa opção, projetamos um futuro de crises econômicas, mal estar social, desequilíbrio climático, guerras, epidemias, poluição, caos... na outra, menor opulência material (luxo) de uns poucos, porém mais tempo livre para todos, água, alimentos e ar de qualidades, bem estar social e cultural, razoável conforto material e uma sociedade sustentável. Utopia? Opção? Ideologia? Possibilidade? Ou apenas o primeiro capítulo da nossa história como civilização de fato?

Prof. Édi Augusto Benini

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