Páginas Vinculadas

Página específica para a 3ª edição do curso de especialização em Gestão Pública e Sociedade:

domingo, 27 de setembro de 2009

Liberdade e Justiça Social

Liberdade e justiça social

FREI BETTO

Escritor, é autor de Diário de Fernando — nos cárceres da ditadura militar brasileira (Rocco), entre outros livros



Na década de 1980 visitei, com frequência, países socialistas: União Soviética, China, Alemanha Oriental, Polônia, Tchecoslováquia e Cuba. Estive também na Nicarágua sandinista. As viagens decorreram de convites dos governos daqueles países, interessados no diálogo entre Estado e Igreja.

Do que observei, concluí que socialismo e capitalismo não lograram vencer a dicotomia entre justiça e liberdade. Ao socializar o acesso aos bens materiais básicos e aos direitos elementares (alimentação, saúde, educação, trabalho, moradia e lazer), o socialismo implantara, contudo, um sistema mais justo à maioria da população que o capitalismo.

Ainda que incapaz de evitar a desigualdade social e, portanto, estruturas injustas, o capitalismo instaurou, aparentemente, uma liberdade — de expressão, reunião, locomoção, crença etc. — que não se via em todos os países socialistas governados por um partido único (o comunista), cujos filiados estavam sujeitos ao “centralismo democrático”.

Residiria o ideal num sistema capaz de reunir a justiça social, predominante no socialismo, com a liberdade individual vigente no capitalismo? Essa questão me foi colocada por amigos durante anos. Opinei que a dicotomia é inerente ao capitalismo. A prática de liberdade que nele predomina não condiz com os princípios de justiça. Basta lembrar que seus pressupostos paradigmáticos — competitividade, apropriação privada da riqueza e soberania do mercado — são antagônicos aos princípios socialistas (e evangélicos) de solidariedade, partilha, defesa dos direitos dos pobres e da soberania da vida sobre os bens materiais.

No capitalismo, a apropriação individual e ilimitada da riqueza é direito protegido por lei. E a aritmética e o bom-senso ensinam que quando um se apropria muitos são desapropriados. A opulência de uns poucos decorre da carência de muitos.

A história da riqueza no capitalismo é uma sequência de guerras, opressão colonialista, saques, roubos, invasões, anexações, especulações etc. Basta verificar o que sucedeu na América Latina, na África e na Ásia entre os séculos 16 e a primeira metade do século 20.

Hoje, a riqueza da maioria das nações desenvolvidas decorre da pobreza dos países ditos emergentes. Ainda agora os parâmetros que regem a Organização Mundial do Comércio (OMC) são claramente favoráveis às nações metropolitanas e desfavoráveis aos países exportadores de matérias-primas e mão de obra barata.

Um país capitalista que agisse segundo os princípios da justiça cometeria um suicídio sistêmico; deixaria de ser capitalista. Nos anos 1980, ao integrar a Comissão Sueca de Direitos Humanos, fui questionado, em Uppsala, por que o Brasil, com tanta fartura, não conseguia erradicar a miséria, como fizera a pequena Suécia. Perguntei-lhes: “Quantas empresas brasileiras estão instaladas na Suécia?” Fez-se prolongado silêncio.

Naquela época, nenhuma empresa brasileira operava na Suécia. Em seguida, indaguei: “Quantas empresas suecas estão presentes no Brasil?” Todos sabiam que havia marcas suecas em quase toda a América Latina, como Volvo, Scania, Ericsson e a SKF, mas não precisamente quantas no Brasil. “Vinte e seis”, esclareci. (Hoje são 180). Como falar em justiça quando um dos pratos da balança comercial é obviamente favorável ao país exportador em detrimento do importador?

Sim, a injustiça social é inerente ao capitalismo, poderia alguém admitir. E logo objetar: mas não é verdade que, no capitalismo, o que falta em justiça sobra em liberdade? Nos países capitalistas não predominam o pluripartidarismo, a democracia, o sufrágio universal, e cidadãos e cidadãs não manifestam com liberdade suas críticas, crenças e opiniões? Não podem viajar livremente e até mesmo escolher viver em outro país, sem precisar imitar os balseros cubanos?

De fato, nos países capitalistas a liberdade existe apenas para uma minoria, a casta dos que têm riqueza e poder. Para os demais, vigora o regime de liberdade consentida e virtual. Como falar de liberdade de expressão da faxineira, do pequeno agricultor, do operário? É uma liberdade virtual, pois não dispõem de meios para exercitá-la. E se criticam o governo, isso soa como um pingo de água submergido pela onda avassaladora dos meios de comunicação — TV, rádio, internet, jornais, revistas — em mãos da elite, que trata de infundir na opinião pública sua visão de mundo e seu critério de valores. Inclusive a ideia de que miseráveis e pobres são livres.

Por que os votos dessa gente jamais produzem mudanças estruturais? No capitalismo, devido à abundância de ofertas no mercado e à indução publicitária ao consumo supérfluo, qualquer pessoa que disponha de um mínimo de renda é livre para escolher, nas gôndolas dos supermercados, entre diferentes marcas de sabonetes ou cervejas. Tente-se, porém, escolher um governo voltado aos direitos dos mais pobres! Tente-se alterar o sacrossanto “direito” de propriedade (baseado na sonegação desse direito à maioria). E por que Europa e EUA fecham suas fronteiras aos imigrantes dos países pobres? Onde a liberdade de locomoção? Sem os pressupostos da justiça social, não se pode assegurar liberdade para todos.

Obs: artigo extraído do sítio: http://www.correiocidadania.com.br/content/view/3792/55/

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

GRUPO DE ESTUDOS

Colegas:

Convido a todos vocês para participarem do nosso grupo de estudos que será realizada no dia 26/09/2009 às 14:30, Bloco C, Sala 01. Para discutirmos a estatuinte do nosso grupo que está sendo elaborada pela Zenaide (membro do grupo).

Aguardo a todos.

"consolidação dos leis sociais": uma primeira análise crítica

Alguns pessoas estão indagando sobre a tal "Consolidação das Leis Sociais", inspiradas na CLT. Não conheço o conteúdo desta proposta, mas pelas notícias já podemos fazer (ou arriscar) alguns considerações para o debate crítico e sério, a quem interessar o debate... e quem sabe fazer uma ponte com a economia solidária... vou pontuar para facilitar o raciocínio:

1. Consolidar significa manter algo e aglutinar partes dispersas num único ordenamento, nenhuma novidade até aqui.

2. Vale lembrar que a CLT - consolidação das leis trabalhistas - é fruto da luta histórica dos trabalhadores contra a exploração do trabalho, por meio de medidas defensivas tais como férias, 13 salário, jornada de 40 horas semanais... no Brasil, na ausência de uma autêntica luta popular, foi uma necessidade econômica de aumento do mercado consumidor, para o projeto Getulista de industrialiação e modernização capitalista, a partir dos interesses nacionais, que fez com que o Estado implantasse tal proposta.

3. Com isso, a CLT nada mais é que a "consolidação", no Brasil, de um conjunto de direitos sociais conquistados duramente pelos trabalhadores. Mas em que pese tal conquista, é importante entender que ela é defensiva, ou seja, alguns direitos como forma de amenizar a exploração e degradação do trabalho (mas que não ataca o "cancer" central, que é justamente a propriedade privada dos meios de produção).

4. No pós guerra, em alguns paises centrais, o avanço dos direitos sociais, quase no limite da taxa de lucro interna do setor empresarial, combinado com a dinamica de reconstrução européia, disponibilidade de nova base tecnica desenvolvida na guerra, competição do ocidente contra o "socialismo real" da URSS (que poderia inspirar a revolta de milhões de trabalhadores), e especialmente a retomada da exploração das transnacionais sobre os paises pobres e subdesenvolvidos, voltando a pilhar suas riquezas, viabilizou, do ponto de vista economia e político, o ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL, o máximo de qualidade de vida conseguido por alguns povos, naquelas condições, dentro do capitalismo.

5. Após a 3ª revolução industrial (anos 80), o financiamento desse Estado de Bem estar Social é minado pelo desemprego estrutural (tecnologias poupadoras da mercadoria trabalho), temos a crise fiscal do Estado, por um lado, e crise do consumo, esta saneada, por quase duas décadas, e de forma ARTIFICIAL, pela sistema financeiro (que demostrou apenas uma faceta da sua farsa em setembro de 2008). Logo, a tendência atual, NOS PAISES RICOS, É o aumento do desemprego, precarização do trabalho (menos qualidade, menos remuneração e mais tempo de trabalho), aumento das favelas, além da intensificação dos danos ecológicos...


(já viram que apenas com discursos não dá para realizar um real análise da realidade e das necessidades e problemas do povo)


6. Dentro Da atual fase do capitalismo histórico, eminentemente financeiro e destrutivo, não é mais possível reformas sociais, não há condições objetivas, econômicas e históricas para um Estado de Bem-Estar Social, para condições de vida digna para todas as pessoas, isso porque se a taxa de lucro é menor ou descreçe, pois a tecnologia reduz massa salarial e, com isso, as vendas, é preciso explorar mais o trabalho, negar direitos, e aumentar o consumo de superfluos, bens de luxo, e a taxa de obsolência (destruição mais rápida que criação), o que explica a ofensiva voraz sobre os bens ecológicos (numa lógica de colossal desperdício), e estando a eficiência empresarial pautada pela competição capitalista, é necessário sempre e de forma constante reduzir custos com a mercadoria trabalho (por exemplo, fim do 13 salário), intensificar o ritmo de produção e destruição, pois trata-se de um imperativo de sobrevivência, mesmo para a mais exemplar empresa de responsabilidade social, uma questão de sobrevivência dentro das "atuais regras do jogo"...

7. No contexto de um país como o Brasil, temos a emergência de políticas sociais compensatórias (compensar o sofrimento e a situação degradante que resultou de séculos de exploração do trabalho, por meio de extorção da riqueza, criada pelo trabalhador, e concentrada com o "proprietário", e este trabalhador, por ser objeto apenas do sistema produtivo, uma engrenagem, e não sujeito, sofre uma degradação persistente e secular, no seu corpo, forma de viver, organização política, vida cultural, o deixando em situação de grande vulnerabilidade social)

8. Logo, consolidar leis sociais seria manter os mecanismos que amenizam o sofrimento humano, melhoram as condições de vida de parte significativa do nosso povo, porém, numa dialética estruturalmente contraditória em si, também se fortalece as chamadas "armadilhas da pobreza", uma vez que a exploração do trabalho é blindada (nada pode contestar a propriedade privada dos meios de produção) e legitimada (quem pode, alguns poucos super dotados, e outros que tiverem sorte, "sobem" na vida), os azarados, infelizes, excluídos desta suposta prosperidade, (e incluídos nas engrenages do sistema econômico despótico do capital) podem ao menos sobreviver, sem almejar ou poder pensar e lutar a sua emancipação...

e os recursos naturais no brasil?

9. podem potencialmente promover alguma melhoria material no médio prazo (muito para poucos e muito pouco para muitos), mas uma exploração excessiva da floresta causará, no longo prazo, deterioração perigosa nos ciclos ecológicos, com danos imponderáveis sobre a vida humana... é como literalmente jogar perolas aos porcos... o agronegócio de exportação está substituindo a riqueza sustentável dos multi-sistemas ecológicos, da agricultura familiar, pela riqueza "de um ciclo só" da extração de madeira, criação de gado, grandes UHE, etc, uma verdadeira reconversão colonial.

10. o uso do petroleo do pré-sal, se ficar com a UNIão (melhor cenário), poderá ajudar o desenvolvimento de tecnologias alternativas, se usado para isso, e melhorar o nivel de renda geral, ou gerar, ao mesmo tempo um consumo imediatista e opulente, junto com um processo de desindustrialiação (doença holandesa), pois baratearia as importações e inviabilizaria a industria nacional... mas no capitalismo, o avanço tecnico leva ao desemprego ou precarização, e à concentração de renda e riqueza... além do mais, a continuar uma matriz energética em combustiveis fosseis, os danos ecológicos também serão potencializados... (isso no melhor cenário, creio não ser preciso comentar as demais alternativas)

e, por fim, a economia solidária


11. a continuar com essa estrutura de cooperativas isoladas, com a mesma lógica empresarial da competitividade (agora de grupos e não individual, o que não muda em nada a situação), crescimento baseada na acumulação e no valor de troca para umas, e sobrevivência baseada na subordinação econômica nas cadeiras produtivas, para outras, será apenas unidades produtivas tão capitalista quanto as demais, tão destrutiva quanto as demais... ainda que aparentemente se tenha abolido a figura do patrão ou proprietário capitalista, mas que persiste plenamente na esfera da circulação (como muito bem demonstrou Rosa), e as chamadas "redes" não tem amplitude nenhuma para resolver isso, estão na esfera de parcerias pontuais para eventos, etc, e não no fluxo dos valores agregados.


12. se buscar o caminho de enfrentamento dificil, complicado, mas necessário ou fundamental, de uma nova estrutura organizacional-institucional , que supere o valor de troca, e a propriedade privada (de grupos pseudo-autogestionários), estrutura econômica e cadeias produtivas fragmentas e dissociadas... se superar tais elementos essenciais da lógica do capital, apontando para uma lógica de propriedade orgânica e renda sistêmica, governança federativa ou em comunas, autogestão social, integração financeira e tecnológica... então haverá uma nova perspectiva, de fato, de desenvolvimento que promova uma sociedade sustentável, no qual a tecnologia seja para produzir melhor, com mais duração, e menos tempo de trabalho (no conteúdo e na forma, ainda que com alguns elementos tayloristas, a serem superados pela automação), e o determinante "capital acumulado" é literamente substituido pelo determinante de "trabalho disponível" (ora, se uma parte dos trabalhadores é suficiente para, jornadas diárias reduzidas, produzir os bens necessários para TODOS, a outra parte se desloca, NATURALMENTE, para a "produção" de bens superiores, como artes, cultura, esportes, lazer, conhecimentos, etc, também em jornadas reduzidas)... e sem a produção de superfluos, sem a frenética taxa de obsolecência, sem a industria da destruição (guerras, violência), sem a industria do lucro (necessidades artificialmente criadas, como doenças, transportes em longas distancias pela especulação imobiliária, cursinhos, seguros, etc)... obviamente que a base de riqueza material se potencializa consideravelmente, ao mesmo tempo que a pressão sobre os recursos naturais e ecológicos poderá voltar a um ponto crucial de equilíbrio e/ou regularidade (taxa de reposição segura)... será necessário quanto mais de sofrimento humano para acordamos para tais opções?

Abraços libertários




Prof. Édi Augusto Benini
Universidade Federal do Tocantins

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Avança a destruição dos ecossistemas na amazônia

Vejam esta notícia: Projetos para acabar com duas Florestas Nacionais recebem parecer favorável - 17/09/2009

Local: São Paulo - SP
Fonte: Amazonia.org.br
Link: http://www.amazonia.org.br


Comentários:

Para reflexão de todos, gostaria de ponderar alguns pontos:

1) como avaliar um tipo de desenvolvimento?

2) é válida a oposição entre preservação ecológica e prosperidade econômica?



Alguns até chegam a argumentar nesses termos: "não podemos ficar pobres para defender bichos e mato, se os ricos destruiram, por que não podemos fazer o mesmo"... ou ainda ..."se tem que acabar com tudo e o mundo vai acabar, para que preservar florestas, vamos gerar empregos, vamos buscar mais riqueza e prosperidade"... que prosperidade é essa, pergunto!

Prosperidade, no meu entender, seria aproveitar recursos naturais para melhorar as condicoes de vida das pessoas, que precisam também do equilibrio ecologico simplesmente para ser possivel viver... mas no capitalismo, tudo é objeto de exploração, ou seja, ao contrário da opção lógica de usar a tecnologia ou o progresso técnico para produzir melhor, mais barato, com mais duração, com custos sistemicos menores para todos, além de uma melhor renda e igualdade para os trabalhadores, com mais tempo livre, tempo para viver plenamente e com riqueza social e cultural, ou seja, uma existencia focada no ser e não no ter... ao contrário disso tudo, plenamento possível, a tecnologia e o sistema produtivo estão a serviço da produção de superfluos, que duram pouco e intensifica o uso do trabalho, o uso dos recursos, logo, temos mais e maiores custos sistemicos (sociais da pobreza, falta de saude, desemprego, violência), economicos (desperdicio, luxo, alto custo para a manutenção do poder de alguns com várias ações de cooptação ou enquadramento, gastos com segurança privada, custos de transações, etc...), dessa forma, a combinação de fatores é a pior possivel, logo, nessa lógica dominante, é como se para o corpo social se "sustentar", precisar ir se auto-consumindo (devorando braços e pernas) até chegar no limite que o proprio corpo social, base de uma civilização, falecer por completo.... genial isso não acha!

É cada vez mais crucial re-pensarmos as bases da nossa sociedade, pois projeta-se dois caminhos, um salto qualitativo em termos de civilidade, ou o horizonte cada vez mais próximo do desespero...

Prof. Edi Augusto Benini - Palmas-TO

terça-feira, 15 de setembro de 2009

O mito da tributação elevada no Brasil

O mito da tributação elevada no Brasil

MARCIO POCHMANN

As especificidades do Brasil dificultam comparações. Cabem duas observações que desconstroem o mito da tributação elevada

O TEMA relativo ao peso dos impostos, taxas e contribuições no Brasil permanece ainda sendo tratado na superfície. A identificação de que a carga tributária supera 35% do PIB (Produto Interno Bruto) é um simples registro, insuficiente, por si só, para permitir comparações adequadas com outros países. Ou seja, mencionar que o Brasil possui carga tributária de país rico, embora se situe no bloco das nações de renda intermediária, ajuda pouco, quando não confunde o entendimento a respeito das especificidades nacionais. Elas dificultam análises comparativas internacionais e exigem maior investigação.
Por causa disso, cabem, pelo menos, duas observações principais que terminam por desconstruir o mito da tributação elevada no Brasil.
Em primeiro lugar, a observação de que os impostos, taxas e contribuições incidem regressivamente sobre os brasileiros. Como o país mantém uma péssima repartição da renda e riqueza, há segmentos sociais que praticamente não sentem o peso da tributação, ao contrário de outros submetidos ao fardo muito expressivo da arrecadação fiscal.
Os ricos brasileiros quase não pagam impostos, taxas e contribuições.
Os 10% mais ricos, que concentram três quartos de toda a riqueza do país, estão praticamente imunizados contra o vírus da tributação, seja pela falta de impostos que incidam direta e especialmente sobre eles -como o tributo sobre grandes fortunas-, seja porque contam com assessorias sofisticadas para encontrar brechas legais para planejar ganhos quase ausentes de impostos, taxas e contribuições.
Já os pobres não têm escapatória, pois estão condenados a compartilhar suas reduzidas rendas com o financiamento do Estado brasileiro. Isso porque a tributação brasileira é pesadamente indireta, ou seja, arrecada a maior parte em impostos sobre produtos e serviços -portanto, pesa mais para quem ganha menos.
Além disso, há uma tributação direta, sobre renda e bens, muito "tímida" em termos de progressividade. O Imposto de Renda, que, nos EUA, tem cinco faixas e alíquotas de até 40% e, na França, 12 faixas com até 57%, no Brasil tem apenas duas, com alíquota máxima de 27,5%. Aqui, impostos sobre patrimônio, como IPTU ou ITR, nem progressividade têm.
As habitações dos mais pobres, por exemplo, pagam, proporcionalmente à renda, mais tributos em geral do que aqueles que residem nas mansões, enquanto os grandes proprietários de terra convivem com impostos reduzidos e decrescentes.
Aqueles com renda acima de R$ 3.900 contribuem apenas com 23%.
No entanto, quem vive com renda média mensal de R$ 73 transfere um terço para a receita tributária.
Em síntese, a pobreza no Brasil não implica somente a insuficiência de renda para sobreviver, mas também a condição de pagar mais impostos, taxas e contribuições.
Em segundo lugar, a observação de que a carga tributária corresponde à capacidade efetiva de gasto da administração pública brasileiro, conforme comparações internacionais indicam ser. No Brasil, a cada R$ 3 arrecadados pela tributação, somente R$ 1 termina sendo alocado livremente pelos governantes.
Isso porque, uma vez arrecadado, configurando a carga tributária bruta, há a quase imediata devolução a determinados segmentos sociais na forma de subsídios, isenções, transferências sociais e pagamento dos juros do endividamento público.
Noutras palavras, R$ 2 de cada R$ 3 arrecadados só passeiam pela esfera pública antes de retornar imediata e diretamente aos ricos (recebimento de juros da dívida), às empresas (subsídios e incentivos) e aos beneficiários de aposentadorias e pensões.
Assim, o uso da carga tributária bruta no Brasil se transforma num indicador pouco eficaz para aferir o peso real da tributação.
Talvez o mais adequado possa ser análises sobre a carga tributária líquida, que é aquela que, de fato, indica a magnitude efetiva dos impostos, taxas e contribuições relativamente ao tamanho da renda dos brasileiros, pois é com essa quantia que os governantes conduzem (bem ou mal) o conjunto das políticas públicas.
Nesse sentido, a tributação elevada é um mito no Brasil. A carga tributária líquida permanece estabilizada em 12% do PIB já faz tempo. O que tem aumentado mesmo são impostos, taxas e contribuições que, uma vez arrecadados, são imediatamente devolvidos, o que impede de serem considerados efetivamente como peso da tributação elevada.

MARCIO POCHMANN , 46, economista, professor licenciado do Instituto de Economia e do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), é presidente do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Foi secretário do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade da Prefeitura de São Paulo (gestão Marta Suplicy).


Publicado originalmente no jornal Folha de São Paulo, domingo, 14 de setembro de 2008.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

convites - filme e debate na UFT

Próxima sexta feira, dia 11 de setembro, a Universidade Federal do Tocantins, por meio do curso de especialização em Gestão Pública e Sociedade, convida todos os interessados para as seguintes atividades:


17h00min - Filme: Políticas de Saúde no Brasil: um século de luta pela saúde


19h30min - Debate: Democratização do Estado - legalidade ou legitimidade
com a presença dos professores:
Prof. José Luiz Riani Costa (Unesp)
Prof.ª Shirley Andrade (UFT)

Local: Auditório do bloco C - UFT - Campus de Palmas


Sinopse do filme:
O documentário conta a história das políticas de saúde em nosso país,
mostrando como ela se articulou com a história política brasileira,
destacando os mecanismos que foram criados para sua implementação, desde
as Caixas de Aposentadorias e Pensões até a implantação do SUS.
Sua narrativa central mostra como a saúde era considerada, no início do
século XX, um dever da população, com as práticas sanitárias implantadas
autoritariamente pelo Estado, de modo articulado aos interesses do
capital, e como, no decorrer do século, através da luta popular, essa
relação se inverteu, passando a ser considerada, a partir da
Constituição de 1988, um direito do cidadão e um dever do Estado.
Toda essa trajetória é contada através de uma narrativa ficcional,
vivida por atores, com reconstrução de época, apoiada por material de arquivo.
Para tornar a narrativa mais leve e atraente, o filme se vale da
linguagem dos meios de comunicação dominantes em cada época, como o jornal, o
rádio, a TV Preto e branco, a TV colorida e, por fim, a internet.
O filme foi realizado por iniciativa da Secretaria de Gestão Estratégica
e Participativa, do Ministério da Saúde, em parceria com a Organização Pan-Americana
da Saúde - OPAS e a Universidade Federal Fluminense/UFF.
O documentário é composto por 5 capítulos, cobrindo os seguintes períodos:
>> 1900 a 1930; 1930 a 1945; 1945 a 1964; 1964 a 1988; e 1988 a 2006.

Maiores informações: edibenini@uft.edu.br





quinta-feira, 3 de setembro de 2009

São Paulo avança na "privatização" da esfera pública

Notícia de hoje (03/09/2009) na folha on-line: São Paulo aprova cobrança em hospital público

Infelizmente o estado mais rico da nação brasileira, parece que também vem liderando um colossal retrocesso em termos de civilidade e organização societal.

A lógica é perversa, primeiro uma explicação enviesada sobre as causas e problemas do serviço público, ressaltando que o "mal" está em justamente ser público, e por isso, inerentemente menos produtivos e mais custosos, logo, nessa visão, temos num segundo momento a proposta redentora de mercantilizar um bem público, ou seja, privatizar os serviços públicos.

Ora, com tal artificio, oculta-se que a grande problemática do setor público resisde justamente por não ser, efetivamente, público e democrático! Ou seja, sua estrutura é composta por uma forma de organização interna burocrática e patrimonialista, e um tipo de desenvolvimento centrado na acumulação de poucos. Como a população, em geral, não tolera mais a baixa qualidade da saúde (causada primeiro por sua privatização material), agora se vende a solução mágica, que é a sua mercantilização (passar para a privatização formalizada e consolidada)

Explicando melhor:

Em grande medida, podemos argumentar que a escolha dos dirigentes públicos está baseada na lógica de governabilidade político-partidária, uma lógica patrimonialista (um bem público a serviço de poucos, e não para o povo) o que impacta de forma decisiva na desmotivação do servidor cuja carreira é servir, com dedicação, ao seu povo, e também na desorganização dos fluxos e rotinas gerenciais.

Numa visão mais ampla e agregada, estima-se (não temos ainda os números exatos), que o gasto público com saúde é da ordem de R$ 50 a R$ 60 bilhões, isso para atender 156 milhões de vidas, enquanto o gasto particular custa entre R$ 103 e R$ 113 bilhões para atender aproximadamente 34 milhões de vidas.

Ou seja, esquematicamente temos

No setor Público:
  • custeio: R$ 59 bilhões (PLOA 2009)
  • abrangência: 156 milhões de pessoas
  • per capita: R$ 378,00 para cada pessoa que não pode pagar por um plano particular, por ano

No setor mercantil:

  • custeio: R$ 103 bilhões (baixa estimativa)
  • abrangência: 34 milhões
  • per capita: R$ 3.030,00 cada pessoa paga por um plano particular de saude, por ano

Isso demonstra, numa simples equação, que do ponto de vista de eficiência, a saúde pública é 10 vezes mais "eficiente". Porém, no ponto de vista de eficácia, ou seja, qualidade, é claro que esta deixa a desejar, e muito, porém aqui o cálculo é mais problemático. Primeiro é preciso evidenciar qual é o minimo de gasto, per capita, necessário para um sistema, qualquer que seja, ter igualmente um minimo de estrutura operacional para funcionar. A questão aqui não é amplitude, e sim aonde está o ponto de equilíbrio, ou seja, o quanto estamos distantes para que realmente um sistema funcione para atender tal escala ou escopo. Fazendo uma analogia, de nada adianta gastar R$ 50.000,00 num veículo qualquer, se faltou R$ 500,00 para montar os pneus, obviamente ele não terá eficácia alguma, por mais moderno e avançado que seja tal veículo!

Sobre a efetividade, aqui claramente a questão mercantil tem uma lógica contrária as demandas de bem estar social, ou seja, o aumento do número de "doenças" é benefica para esta lógica, pois aumenta a necessidade de compra da mercadoria saúde (especialmente de tipo curativo)... e com isso aumenta a lucrabilidade de alguns poucos.

Porém, na lógica de bem público, o problema se inverte, pois é desejável diminuir a demanda pelos serviços de saúde, diminuir as "doenças" e outros problemas, por meio da prevenção, pois o foco não é vender um produto, mas sim promover, a rigor, uma vida saudável para todos.

Dessa forma, o problema central dos serviços públicos de saúde está em justamente não ser um BEM PÚBLICO (falta amplitude de financiamente adequada, que é direcionada ao setor mercantil, na lógica de criar problemas para vender soluções), e por não ser DEMOCRÁTICA (um tipo de gestão pública que não está alicerçado aos interesse do povo como um todo).


Logo, o processo de privatização dos serviços de saúde apenas visam atendem ao lucro de alguns poucos, em prejuízo gritante ao direito de uma vida plena das pessoas.


Prof. Édi Augusto Benini

terça-feira, 1 de setembro de 2009

O petróle como um "Bem Público"

Segue abaixo nota dos movimentos sociais, importante para o debate e ter uma visão alternativa à do governo:



Petroleiros apresentam projeto pelo monopólio estatal e Petrobrás 100% pública



31-Ago-2009

Antecipando-se ao anúncio do presidente Lula, a Federação Única dos Petroleiros, a Associação dos Engenheiros da Petrobrás e o Sindicato dos Petroleiros do Rio de Janeiro protocolaram hoje no Congresso Nacional o projeto de lei do petróleo dos movimentos sociais.

Acabar com os leilões e recuperar as áreas entregues. Tornar a Petrobrás uma empresa 100% pública e estatal. Investir seriamente em matrizes energéticas limpas e renováveis. Criar um fundo social soberano para investir os recursos do petróleo em saúde, educação, reforma agrária, moradia etc. Esses são alguns dos eixos do projeto apresentado hoje pelas entidades petroleiras.

O projeto foi apresentado pelo deputado federal Fernando Marroni (PT-RS), pois a burocracia da Câmara Federal exige que apenas um seja indicado como autor, mas outros 22 parlamentares assinam a iniciativa como co-autores. O suprapartidarismo do movimento está explícito no fato de representantes do PT, PCdoB, PDT e PSOL já referendarem o documento.

"Precisamos juntar todas as forças em defesa do nosso projeto. Sabemos que o governo vem com essa proposta de criação de uma nova empresa, mas não podemos aceitar isso. Isso é um engodo. Temos que defender a Petrobrás 100% pública e estatal com toda nossa energia. O pré-sal pode mudar a vida do nosso povo, não podemos partilhá-lo com as multinacionais", afirma Emanuel Cancella, coordenador geral do Sindipetro-RJ.

Alternativa popular ao projeto de petróleo do Governo Federal

Os petroleiros correram nas últimas semanas para concluir e acertar as arestas dessa proposta, pois avaliaram ser fundamental apresentar o projeto do movimento social que constrói a campanha ‘O Petróleo Tem que Ser Nosso’ antes do anúncio do presidente brasileiro, marcado para segunda, dia 31 de agosto, em Brasília. A idéia é que fique claro para todos os setores, inclusive para Lula, que tramita no Congresso um projeto que levanta as bandeiras populares.

Todas as sinalizações dadas até agora pelo governo federal são de que o projeto deles será muito distante daquilo que o movimento social reivindica. A adoção do modelo de partilha é considerada um absurdo, pois propõe dividir a riqueza brasileira com empresas estrangeiras. A constituição de uma nova estatal para administrar o pré-sal, um empresa enxuta com poucos funcionários, vai enfraquecer a Petrobrás e abrir margem para que muitos serviços e boa parte da gestão das áreas petrolíferas fiquem na mão da iniciativa privada. Essa nova empresa seria uma fiscalizadora.

O projeto foi protocolado na manhã de quinta (27), por volta das 9h30, na Câmara dos Deputados. Em seguida, o deputado Marroni fez um discurso em plenário para informar os colegas de parlamento sobre o fato, apresentar as idéias principais da proposta e saudar a iniciativa dos movimentos que compõem a campanha ‘O Petróleo Tem que Ser Nosso’.

Os petroleiros ficaram de organizar uma grande caravana a Brasília pela aprovação do projeto, trazendo inclusive as assinaturas coletadas por uma lei de interesse popular do petróleo. Deve acontecer na semana que vem ou na outra uma Audiência Pública no Congresso Nacional sobre o projeto apresentado pelos movimentos sociais. Acompanhe as próximas ações pela página da Agência Petroleira de Notícias.

Assista hoje (28), na TV Educativa do Paraná, debate sobre campanha do petróleo. Documentário será exibido no sábado

A TV Educativa do Paraná exibe nesta sexta (28), às 22h10, programa sobre a luta em defesa do petróleo e gás brasileiros, com a participação de Emanuel Cancella, coordenador geral do Sindipetro-RJ. O programa Projeto Popular, produzido pela emissora, é exibido em todo o país através do sinal de parabólica 1320MHZ, polarização horizontal, transmitido em sinal aberto VHF em todo o Paraná, por meio da emissora Cidade Livre de Brasília, canal 8 da NET e pela Sky, canal 115.

A programação também pode ser vista em tempo real pela internet no sítio www.pr.gov.br/tve. O programa tem uma hora de duração. No sábado (29), a TV Educativa do Paraná exibe o documentário ‘O Petróleo Tem que Ser Nosso – Última Fronteira’, às 22h30. Assista!

Publicado originalmente pela Agência Petroleira de Notícias.

Website: www.apn.org.br

Vejam também: http://www.youtube.com/watch?v=RF1r4olwmzY

Espaço Público e Processo Decisório

Próxima disciplina do curso de especialização em Gestão Pública e Sociedade: Espaço Público e Processo Decisório


Datas: 11, 12 e 13 de setembro (começando dia 11 às 14:00)

Local: bloco C, auditório, UFT


Professor: Dr. José Luiz Riani Costa

Currículo:

José Luiz Riani Costa é Médico (UNICAMPO - 1977) , com especialização em Medicina do Trabalho (Unicamp - 1979), Especialização em Políticas Públicas e Gestão Governamental (ENAP - 1990), Mestrado em Medicina (UNICAMP - 1983) e Doutorado em Saúde Coletiva (Unicamp - 2002).

É professor da Unesp no Campus de Rio Claro (Instituto de Biociências), tendo atuado também nos Campus de Botucatu (Faculdade de Medicina) e Araraquara (Curso de Administração Pública). Foi professor da UNICAMP (Faculdade de Ciências Médicas) e Universidade de Brasilia - Atuou como Secretário de Segurança e Medicina do Trabalho (Ministério do Trabalho), Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (Ministérios da Saúde e do Planejamento), Secretário Municipal de Saúde de Rio Claro, Diretor do Departamento de Monitoramento e Avaliação da Gestão do SUS e do Departamento Nacional de Auditoria do SUS - DENASUS, do Ministério da Saúde. Assossorou a Organização Pan-Americana de Saúde - OPAS, com trabalhos realizados no Brasil Colômbia e Bolívia.



Ementa da Disciplina:

Desvendar as diferentes arenas decisórias e seus impactos nas políticas públicas; Negociação e conflitos; Política eleitoral (executivo e legislativo); Presidencialismo e Governabilidade; Conselhos Gestores; Orçamento Participativo;


Guia das Falácias

Guia Das Falácias
de Stephen Downes
(disciplina metodologia científica)


O objetivo de um argumento é expor as razões que sustentam uma conclusão. Um argumento é falacioso quando parece que as razões apresentadas sustentam a conclusão, mas na realidade não sustentam. Da mesma maneira que há padrões típicos, largamente usados, de argumentação correta, também há padrões típicos de argumento falacioso. A tradição lógica e filosófica procurou inventariar e batizar essas falácias típicas e este guia pretende listá-las.
• Falácias da Dispersão (manobras de diversão)

o Falso dilema (falsa dicotomia)
o Apelo à ignorância
o Derrapagem (bola de neve ou declive ardiloso)
o Pergunta complexa

• Apelo a Motivos (em vez de razões)

o Apelo à força
o Apelo à piedade
o Apelo a consequências
o Apelo a preconceitos
o Apelo ao povo

• Fugir ao Assunto (falhar o alvo)

o Ataques pessoais
o Apelo à autoridade
o Autoridade anônima
o Estilo sem substância



• Falácias Indutivas


o Generalização precipitada
o Amostra não representativa
o Falsa analogia
o Indução preguiçosa
o Omissão de dados

• Falácias com regras gerais

o Falácia do acidente
o Falácia inversa do acidente

• Falácias causais

o Post hoc
o Efeito conjunto
o Insignificância
o Tomar o efeito pela causa
o Causa complexa

• Falhar o alvo

o Petição de princípio
o Conclusão irrelevante
o Espantalho


Falácias da ambiguidade
o Equívoco
o Anfibologia
o Ênfase

• Erros categoriais

o Falácia da composição
o Falácia da divisão

• Non sequitur

o Falácia da afirmação da consequente
o Falácia da negação da antecedente
o Falácia da inconsistência

• Falácias da explicação

o Inventar fatos
o Distorcer fatos
o Irrefutabilidade
o Âmbito limitado
o Pouca profundidade

• Erros de Definição

o Definição demasiado lata
o Definição demasiado restrita
o Definição pouco clara
o Definição circular
o Definição contraditória


Tradução e adaptação de Júlio Sameiro.