Páginas Vinculadas

Página específica para a 3ª edição do curso de especialização em Gestão Pública e Sociedade:

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

A VIOLÊNCIA DA POBREZA SERÁ ERRADICADA?


Racismo e classe social


Dizia Celso Furtado no seu livro “Projeto para o Brasil”, para a maioria da população se apropriar dos frutos das inovações tecnológicas era preciso atacar histórica deformação estrutural. Ele colocou em pauta o problema do controle do sistema de decisões – poder político - e de sua necessária legitimação em termos de interesse social (1969). A presidente D. Rousseff prometeu erradicar a miséria e reduzir a pobreza. Afirma o pesquisador Sílvio C. Bava: se a linha da pobreza escolhida pelo governo for à estabelecida pelo Banco Mundial (US$ 2/dia) o custo do programa será de R$ 21 bilhões e, ninguém deixará de ser, de fato, pobre. Hoje os gastos com os pobres são apenas 0,4% do Produto Interno Bruto. Sendo o Brasil um dos países com maior desigualdade social do mundo a adoção de novos impostos sobre as heranças e a propriedade, assim como uma maior progressividade na taxação da renda e dos fluxos do capital, são políticas que podem oferecer os recursos necessários para a reforma tributária. Essas políticas existem nos países socialmente avançados. Sílvio lembra que durante a Crise de 1929, nos EUA, Roosevelt, para atacar os problemas sociais gerados pelo capitalismo real, elevou a alíquota superior do imposto de renda para 90% e a burguesia “aceitou o sacrifício”. Não é mais possível que 45% de toda riqueza e renda nacionais no Brasil estejam concentradas mãos de apenas cinco mil famílias e os impostos sobre patrimônio representem só 3,4% do total arrecadado pela União, Estados e municípios. A transferência de renda do trabalho para a renda do capital tem como principais instrumentos a injusta política tributária e o pagamento de juros/agiotas da “dívida pública”, o que é uma violência contra o proletariado. De 2000 a 2007, ela foi cerca de 7% da média total da renda nacional e somou R$ 1, 267 trilhão. Enquanto são beneficiadas as 30 mil famílias que concentram 70% dos títulos públicos em suas mãos, os gastos com saúde pública foram de R$ 310, 9 bilhões e com educação R$ 149,9 bilhões (Le Monde Diplomatique Brasil, 02/2011). A Presidente D. Rousseff, com apoio do PT, do Presidente José Sarney e aliados terá força para realizar a distribuição de renda e livrar os “inframiseráveis” da Bolsa Família (A. Sposati)? O aumento da renda per capita, mesmo depois da Bolsa, ainda permanece por volta de R$65,00. Sem reformas estruturais o crescimento acelerado e a Bolsa não resolverão a inframiséria e a pobreza do Brasil. Por que o social-democrata José Serra, quando candidato, prometeu 13 parcelas de Bolsa para os inframiseráveis? Sem alternativas de trabalho digno, mesmo com 13 Bolsas, a inframiséria continuará existindo. Na festejada classe “C” estão 93 milhões com renda per capita de R$14,18/dia, nas “Classes D e E” 67 milhões com R$8,14/dia e a maioria dos 49 milhões de indigentes (CEPAL, 2010) são negros (as) e pardos inframiseráveis.


Felipe Luiz Gomes e Silva

e-mail:felipeluizgomes@terra.com.br


quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

A dimensão internacional da violação dos Direitos Humanos à alimentação: a miséria da classe trabalhadora, em face da crise estrutural do capital.

Autor: Rogério Fernandes Macedo[1]

A crise estrutural do capital.

Conforme István Mészáros (1989, 2009), o capital, desde suas formas antediluvianas até a década de 1970, descreveu uma trajetória ascendente, universalizante, não obstante a presença das constantes crises cíclicas, com suas oscilações características, com maior ou menor agudez, a depender do momento histórico. Ao longo desses séculos, em meio a tal percurso, o capital se deparou com diversos constrangimentos, frente os quais operou saídas complexas tencionando a ampliação de sua reprodução ampliada em patamar adequado às necessidades das múltiplas burguesias concorrentes e hegemônicas[2]. Por conta desta linha evolutiva, o capital alcançou um ponto, no qual ativou uma série de limites absolutos dinâmicos à sua expansão e acumulação. Estes impelem as burguesias mundiais à criação de alternativas conduzidas pelo critério relativamente rígido da linha de menor resistência[3]. Ao reagir a tais limites absolutos, cuja ativação intensiva e inequívoca se deu ao cabo da década de 1960, o capital aprofunda ainda mais os determinantes desses limites, assim como as atrozes conseqüências oriundas, tanto deles, quanto das estratégias de reação a eles[4]. Por parte de Mészáros (1989, 2009), tal avaliação histórica possibilitou a apreensão teórica de uma nova etapa de desenvolvimento da reprodução social capitalista e que fora denominado por ele crise estrutural do capital[5]. Trata-se de acordo com o autor (1989, 2009), do aprofundamento da impossibilidade histórica da relação capital controlar, respondendo aos seus imperativos sistêmicos internos, a produção e reprodução social humana mediante outros meios históricos que não aqueles inexorável e exclusivamente marcados pela negatividade destrutiva, estruturalmente irreparável, em termos capitalistas. Conseqüentemente, esgota-se aquela fase ascensional do capital; esvaem-se cada vez mais as suas potencialidades civilizatórias; ele está auto-impedido de reproduzir-se proporcionando alguma positividade significativa para a humanidade como um todo. Nota-se que esta crise abarca dimensões amplas, fatalmente perigosas[6], delineando-se como uma crise civilizatória, e não de contingências mercadológicas, sem tempo determinado para acabar e sem promessas de desfecho positivo ou negativo. Tais constatações estimulam as reflexões sobre o campo da luta política circunscrita ao direito e da necessidade de uma avaliação mais apurada das suas potencialidades e limites neste quadro histórico apontado, em face da situação da classe trabalhadora mundial.

Desde seus estudos sobre as formas componentes do exército industrial de reserva, Marx (1985) assinalava a dialética entre produção de riqueza e de miséria sob o sistema de produção do capital[7]. Ali, ele apontou que: “(…) Quanto maiores a riqueza social (…) tanto maior o exército industrial de reserva.” (MARX, 1985. p.209), aumentando assim a superpopulação consolidada e em condições de miséria. A miséria desses trabalhadores se apresenta “(…) em razão inversa do suplício de seu trabalho.” (MARX, 1985, p.209). Em outras palavras, os imperativos do capital imputam a produção de riquezas mediante a miséria ampliada dos seres humanos, subtraindo o elemento que os definem enquanto espécie[8], expondo-os às miserabilidades bárbaras. Cria-se com isso um mecanismo regulador do nível populacional, formando um controle mortuário[9], por assim dizer. Marx (1985) apontará o seguinte: “O mecanismo da produção e acumulação capitalista ajusta constantemente esse número [ou seja, o nível populacional] a essas necessidades de valorização.” (MARX, 1985, p.209). E este ajuste tem duas dimensões mutuamente determinadas: a primeira seria “(…) a criação de uma superpopulação relativa, ou exército industrial de reserva; a última (…), a miséria de camadas sempre crescentes do exército ativo de trabalhadores e o peso morto do pauperismo.” (MARX, 1985, p.209).

Marx (1985) defende ser a miséria uma categoria histórica, imanente e necessária ao processo de universalização da relação social capital. Na crítica à filosofia do direito de Hegel, ele identificou as auto-miserabilidades do processo alemão, tomando como referência as revoluções radicais francesas e inglesas. Alude para a particularidade segunda a qual a “Alemanha acompanhou o desenvolvimento das nações modernas apenas através da atividade abstrata (…), sem tomar parte ativa nas lutas reais deste desenvolvimento (…)” (MARX, 2005, p.153). Ou seja, ela “(…) experimentou (…) as dores deste desenvolvimento sem participar nos seus prazeres e satisfações parciais.” (MARX, 2005, p.153). E a partir desta apreensão prediz a tendência, de que “(…) um belo dia, o alemão encontrar-se-á ao nível da decadência européia, antes de alguma vez ter atingido o nível da emancipação européia.” (MARX, 2005, p.153). O processo alemão compartilha das negatividades capitalistas, sem, contudo, usufruir de suas positividades. Tem ali muito forte a contra-revolução e o conservadorismo, os quais têm sua máxima expressão no nazismo.

No vasto mundo colonial, a particularidade do desenvolvimento capitalista preparou um solo histórico impróprio para o nascimento de uma nação capitalisticamente pujante não havendo ali nenhum usufruto das benesses alguma. Onde o capital terá plena liberdade para se desenvolver, sobrarão apenas miserabilidades multidimensionais. É o próprio Marx (1985) que reconheceu a importância da apreensão do processo histórico nos países de extração colonial, asseverando que se deve “(…) estudar esse assunto em detalhe, para ver o que o burguês faz de si mesmo e do trabalhador onde pode à vontade modelar o mundo segundo sua imagem.” (MARX, 1985, p.286).

Importa teorizar sobre esses determinantes históricos, pois formar-se-ão (LIMA FILHO, 2004) em face desses condicionantes uma série de nações cuja miséria se torna uma dimensão totalizante da sua forma histórica. As relações criadas no vasto Novo Mundo apontam as fronteiras das possibilidades da auto-alienação, da auto-miserabilidade humana distendidas ao máximo, dinamizando a acumulação primitiva mundial do capital. Desta base objetiva, fundada na condução forçada do índio e do negro ao patamar máximo de reificação possível, redundará uma plêiade de sociedades que se reproduzem na barbárie sob condições capitalistas estruturalmente irreversíveis. Esse é o fundamento histórico-concreto da presente miséria, da dependência, da desigualdade nas América Latina e Caribe, na Ásia, na África, no leste europeu.

O que Marx não poderia prever é a dimensão colossal que esta categoria atingiria no século XXI. Sob a determinação da crise estrutural do capital, recai com intensidade inédita sobre a classe trabalhadora todo o fardo das saídas menos resistentes operadas pelo capital, que tenciona manter os patamares de sua acumulação e lucratividade, não importando o quão humanamente indesejável isso seja. A partir dessas pontuações, pode-se expor o seguinte: a categoria miséria sintetiza todas as auto-miserabilidades humanas historicamente determinadas pela auto-alienação do trabalho, realizada esta no interior do processo histórico de universalização da relação social capital como reguladora da produção e reprodução humanas, para a acumulação de riquezas em benefício dos proprietários dos meios significativos de produção, no seio de uma sociedade cindida em classes antagônicas e irreconciliáveis[10]. Como tal, a miséria é uma forma do ser social, cujo conteúdo está atualmente determinado pelo momento particular do capital, que alcança sua forma historicamente mais desenvolvida, sistêmica, totalizante, com a presença de oligopólios privados ou estatais, produtivos ou não, sob regência de gigantescas corporações monopolísticas, dedicadas predominantemente aos dinamismos do capital fictício e a sua ampliação pseudo-redentora. A miséria, em meio a esta totalidade sistêmica do capital, como forma integrante do ser social e tal como se apresenta no atual momento histórico, é uma categoria cujos componentes são econômicos, sociais, políticos, materiais, intelectuais, culturais, educacionais e naturais. Todos vinculados em formas miseráveis, sistematicamente criadas, para a manutenção dos níveis históricos de reprodução ampliada do capital, intrinsecamente irregular e variante; dimensões disparadoras, em sua fase de ascensão, das denominadas crises cíclicas capitalistas, e que culminam nos últimos quarenta anos na crise estrutural do capital[11].

Os capitalismos da miséria e a tragédia da fome.

Como mostrado por Marx (1985), o capital pôde no vasto território colonial desenvolver-se sem constrangimentos, realizando as mais profundas atrocidades contra os trabalhadores. Sob a produção miserável, reproduz-se uma sociedade igualmente assentada na miséria; suas expressões, políticas, sociais, ideológicas e culturais são profundamente estigmatizadas pelo rebaixamento dos trabalhadores ao nível mais abissal de desumanização. Sinteticamente, o nível zero de humanidade[12]. Os países surgidos do ventre colonial possuirão esta marca capitalisticamente indelével[13], em face do que, sua classe trabalhadora padece de toda sorte de afetações próprias às múltiplas dimensões da auto-miserabilidade humana. No seio destes desenvolvimentos históricos, delinear-se-ão o que se denomina aqui Capitalismos da Miséria: países nascidos predominantemente do ventre colonial[14] e que têm na produção e reprodução miseráveis o fundamento da impossibilidade histórica das maiorias trabalhadoras se auto-enriquecer minimamente, bem como de usufruírem dos padrões de relações sociais próprias às repúblicas oriundas das revoluções radicais[15]. Nos capitalismos da miséria estão as multidões ameaçadas pelo espectro da morte: pobreza, fome, doenças, guerras, miséria, todas visceralmente presentes.

A atual expressão da crise estrutural do capital é quase sempre representada por números astronômicos, sobretudo, daqueles referentes à presença redentora do Estado no setor financeiro e produtivo. Mas, ultimamente, o mais aterrorizador deles veio da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação - FAO – que anunciou ter o mundo alcançado a cifra de um bilhão de pessoas sofrendo pelo flagelo da fome[16]. Esta fome referida não se trata, exclusivamente, da sensação que precede o momento de uma refeição e que serve de alerta fisiológico, impelindo os indivíduos a buscarem alimento para suprir suas necessidades nutritivas e energéticas. Trata-se esta fome de uma expressão humana físico-biológica criada no seio da reprodução social regulada pelo capital, bem como acentuada no interior de sua decadência histórica. Estas estatísticas resultam deste longo processo, o qual impeliu uma imensa parcela da classe trabalhadora mundial à miséria. É preciso dizer que a tragédia da fome é apenas uma dimensão da categoria miséria, como bárbara e evidente necessidade imperiosa do sistema produtivo, que reserva à classe trabalhadora possibilidades deveras limitadas de auto-enriquecimento e libertação significativos e abrangentes, alcançados pela luta circunscrita ao campo do direito. Não resulta desta avaliação a defesa do completo abandono dos enfretamentos ali travados, sejam para maiores conquistas, sejam para resistir ao retrocesso irracionalista tentado “democraticamente”[17] e diuturnamente pelas burguesias frente aos direitos historicamente conquistados.

Em face do que foi dito até aqui, é possível averiguar uma tendência ao aumento de todo esse drama, cuja fome é expressão mais atroz. Desde os últimos quarenta anos, as variadas burguesias recorreram intensamente, como resposta à sua crise estrutural,[18] à ampliação do capital fictício, do qual o dinamismo cria um distanciamento relativo frente à base produtiva, de onde surgiu. Simultaneamente, a crise estrutural impõe à humanidade suas pressões sísmicas, que força a redução da massa desse capital fictício, acomodando-a a base produtiva. São essas ocorrências que afetam profusamente a classe trabalhadora, pois é sobre a exploração de sua força de trabalho que as burguesias mundiais conseguem manter a estrutura de comando nas condições aludidas anteriormente[19]. Isso funda aquela tendência ao aumento da miséria, pois ela se realiza em proporção direta à reação das burguesias mundiais às manifestações multidimensionais da crise estrutural do capital, não havendo saídas humanamente viáveis desde o interior do sistema. Inegavelmente, esses são limites intransponíveis às proposituras no campo das lutas por diretos formais, mesmo que eles representem necessidades imprescindíveis, tal como de fato o fazem[20].

Este texto tencionou apreender, dentro dos limites de um artigo, o conjunto de determinantes responsáveis pela violação de todos os denominados direitos humanos (NAÇÕES UNIDAS, 2010), no quadro da crise estrutural do capital. Reforça-se, portanto, a idéia da imprescindibilidade de se teorizar sobre os limites absolutos da luta circunscrita ao campo do direito. De acordo com Mészáros (2009), é preciso lutar pela igualdade substantiva, economicamente viável e humanamente necessária na perspectiva da superação do sistema de produção do capital como um todo, a saber, a edificação da “(…) sociedade de indivíduos livremente associados (…), redefinindo ao mesmo tempo sua relação com o tempo e com o tipo de uso a que servem os produtos do trabalho humano.” (MÉSZÁROS, 2007, grifo do autor, p.256). Assim, a humanidade deixaria sua pré-história, podendo experimentar uma experiência distinta desta miserável, em que está envolta.

Bibliografia.

CASTRO, Josué de. Geopolítica da fome: ensaio sobre os problemas de alimentação e de população do mundo. 7. ed. São Paulo: Brasiliense, livro II e III, 1965. V.1 e V.2. 485p. (Obras escolhidas).

El PAIS. Los sindicatos sacan más gente que nunca a las calles contra la reforma de las pensiones. Disponível em: http://www.elpais.com/articulo/internacional/sindicatos/sacan/gente/calles/reforma/pensiones/elpepuint/20101012elpepuint_4/Tes. Acesso em: 12 de outubro de 2010.

ENGELS, Friedrich. A situação da Classe trabalhadora na Inglaterra. São Paulo: Global, 1985, 391p. (coleção bases).

HOBSBAWN, Eric, J. A Era das Revoluções: 1789 – 1848. 6.ed. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1998.

HOBSBAWN, Eric, J. A Era do Capital: 1848 – 1875. 4.ed. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1988.

LIMA FILHO, Paulo Alves. O golpe de 1964: a vitória e a vitória da ditadura. São Paulo, 2004. 15 p.

LIMA FILHO. Paulo Alves de. Nuvens negras sobre a república: o paraíso em trevas. Desafios à emancipação no Brasil. In: VII Congreso argentino chileno de estudios historicos e integración cultural. Salta: Editorial de la Universidad Nacional de Salta - EUNSa, 25 a 27 de abril de 2007, Republica Argentina, ISBN Nº 978-987-9381-80-9. 21p. Anais... CD-ROM.

MARX, Karl. Crítica da filosofia do direito de Hegel – Introdução. In: ______. Crítica da filosofia do direito de Hegel. São Paulo: Boitempo, 2005. p. 145-156.

MARX, Karl. O capital: crítica da economia política. São Paulo: Nova Cultural, 1988.

MÉSZÁROS, István. O século XXI - socialismo ou barbárie? São Paulo: Boitempo, 2003. 116p.

MÉSZÁROS, István. Para além do capital. São Paulo: Boitempo: 2009. 1102p.

MÉSZÁROS, István. Produção destrutiva e Estado capitalista. São Paulo: Ensaio, 1989. V.05. (Cadernos Ensaio. Pequeno formato).105p.

MÉSZÁROS, István. Teoria da alienação em Marx. São Paulo: Boitempo, 2006. 296p.

NAÇÕES UNIDAS. Declaração dos Direitos Humanos. Disponível em: http://www.onu-brasil.org.br/documentos_direitoshumanos.php Acesso em: 09-10-2010.

PINASSI, Maria Orlanda. A ideologia da crise e o surto incontrolável da irrazão. In: ARRUDA SAMPAIO JÚNIOR, Plínio de (Org.). Capitalismo em crise: a natureza e dinâmica da crise econômica mundial. São Paulo: Editora Instituto José Luís e Rosa Sundermann, 2009b. p. 75-96.

PINASSI, Maria Orlanda. Da miséria ideológica à crise do capital - uma reconciliação histórica. São Paulo: Boitempo, 2009a. (Coleção Mundo do trabalho). 144p.

POLANYI, Karl. A grande transformação: as origens de nossa época. Rio de Janeiro: Campus, 1980. 349p.

SODRÉ, Nelson Werneck. Formação Histórica do Brasil. 5.ed. São Paulo: Brasiliense, 1968. 415p.



[1] Professor do Curso de Ciências Econômicas da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri - UFVJM. Doutorando em Sociologia na Faculdade de Ciências e Letras de Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. Pesquisador do Grupo Trabalho, Movimentos Sociais e Sociabilidade Contemporânea e do Instituto Brasileiro de Estudos Contemporâneos - IBEC.

[2] Dentre essas saídas, ver importante discussão em: MÉSZÁROS, István. A Taxa de uso decrescente no capitalismo. In: ______. Produção destrutiva e Estado capitalista. São Paulo: Ensaio, 1989. V.05. (Cadernos Ensaio. Pequeno formato). p.15-51.

[3] Sobre a linha de menor resistência, ver: MÉSZÁROS, István. A linha de menor resistência do capital. In: ______. Produção destrutiva e Estado capitalista. São Paulo: Ensaio, 1989. V.05. (Cadernos Ensaio. Pequeno formato). p.52-72.

[4] Dentre essas conseqüências, tem-se: “(…) níveis altíssimos de concentração da riqueza material socialmente produzida, de políticas de incentivo ao desemprego crônico, da perda progressiva de direitos trabalhistas, da degradação inigualável das condições de trabalho - entre as quais cresce a ocorrência das relações de escravidão e a proposição pouquíssimo clara de uma nova modalidade de ‘trabalho decente’. Sem mencionar ainda a alarmante destruição do ecossistema. (PINASSI, 2009b, p.76).

[5] Sobre a crise estrutural do capital, ler: MÉSZÁROS, István. Crise estrutural do sistema do capital. In: ______. Para além do capital. Parte 03, São Paulo: Boitempo: 2009. p. 605-980.

[6] MÉSZÁROS, István. O significado do complexo militar-industrial. In: ______. Para além do capital. Parte 03, São Paulo: Boitempo: 2009. p. 685-695.

[7] Ao bem da verdade, tal dialética está presente na obra de Karl Marx, desde seus escritos de juventude. Sobre isso ver: MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos. São Paulo: Boitempo, 2004, 176 p.

[8] MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos. São Paulo: Boitempo, 2004, 176 p. MÉSZÁROS, István. Teoria da alienação em Marx. São Paulo: Boitempo, 2006. 296p. ANTUNES, Ricardo.

[9] Vale registrar que tal teorização dista das conclusões a que chegou teórico inglês Thomas Robert Malthus (1766-1834). Para uma análise crítica sobre as formulações deste autor, ver: CASTRO, Josué de. Geopolítica da fome: ensaio sobre os problemas de alimentação e de população do mundo. 7. ed. São Paulo: Brasiliense, livro II e III, 1965. V.1 e V.2. 485p. (Obras escolhidas).

[10] Para estudo mais detalhado sobre a dialética entre produção de riqueza e de miséria no sistema de produção do capital, ler: ENGELS, Friedrich. A situação da Classe trabalhadora na Inglaterra. São Paulo: Global, 1985, 391p. (coleção bases). HOBSBAWN, Eric, J. A Era das Revoluções: 1789 – 1848. 6.ed. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1998. A Era do Capital: 1848 – 1875. 4.ed. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1988. POLANYI, Karl. A grande transformação: as origens de nossa época. Rio de Janeiro: Campus, 1980. 349p.

[11] Essa é mais uma evidência da atual imprescindibilidade da apreensão de Marx (1985) no que respeita à dialética entre produção de riqueza e de miséria, sob o sistema de produção do capital.

[12] Sobre isso, apropria-se aqui da seguinte definição: “E foi assim que (…) forjou-se uma sociedade solidamente ancorada no nível zero de humanidade, onde o trabalhador para produzir valores à acumulação privada, dentro e fora da colônia e do império politicamente independente, era despojado de sua condição humana. Reduzido a coisa, coisa de valor, mercadoria, força de trabalho em estado puro, descontaminada das necessidades da espécie animal da qual emana. Esta mercadoria sublimada de humanidade produz-se e reproduz-se em sociedade igualmente desumana, governada por classes dominantes desumadas, fortemente instaladas no nível zero de humanidade, no nível máximo de coisificação das relações sociais, de alienação ao capital.”. (LIMA FILHO, 2007, p.03).

[13] Neles, a produção nunca foi destinada à satisfação significativa das necessidades das maiorias trabalhadoras, mas sim à acumulação predominantemente alhures, determinada pelas necessidades das burguesias imperialistas hegemônicas oriundas dos países de revoluções radicais. Sobre isso, ver: SODRÉ, Nelson Werneck. Formação Histórica do Brasil. 5.ed. São Paulo: Brasiliense, 1968.

[14] Existem exceções que não invalidam a tese, dada a sua larga expressão e presença marcante. Dentre as exceções, pode-se citar a Austrália, de via colonial, mas que conseguiu em sua particularidade fugir à larga expressão da miséria do capital em seu espaço territorial.

[15] Vale o registro que existem regiões cuja categoria miséria se desenvolveu a um nível importante e que surgiram de outro processo histórico, que não este próprio ao novo mundo. A título de exemplo, podem ser citados o oriente médio e o leste europeu.

[16] FAO. 1 020 millones de personas pasan hambre. Roma, 19-06-2009. Disponível em: https://www.fao.org.br/, acesso em: 19/06/2009.

[17] Existem autores que defendem ser a atual democracia obscurantista e fascista. Ver: PINASSI, Maria Orlanda. A ideologia da crise e o surto incontrolável da irrazão. In: ARRUDA SAMPAIO JÚNIOR, Plínio de (Org.). Capitalismo em crise: a natureza e dinâmica da crise econômica mundial. São Paulo: Editora Instituto José Luís e Rosa Sundermann, 2009b. p. 75-96.

[18] As mais recentes manifestações da crise estrutural do capital são denominadas pelos ideólogos do capital, de forma auto-vantajosa, das seguintes formas: “Crise do mercado imobiliário estadunidense”, “Crise da Grécia”, “Crise do oriente médio”, “Crise dos subprime”, “Crise de crédito”, “Crise de liquidez”, entre outras. Todas são conceituações redutoras e fragmentadoras que tentam impedir a apreensão do seu caráter abrangente e universal.

[19] Contra o que a classe trabalhadora luta. Veja as reportagens: El PAIS. Los sindicatos sacan más gente que nunca a las calles contra la reforma de las pensiones. Disponível em: http://www.elpais.com/articulo/internacional/sindicatos/sacan/gente/calles/reforma/pensiones/elpepuint/20101012elpepuint_4/Tes. Acesso em: 12 de outubro de 2010.

[20] Vale observa que nunca foi uma necessidade à acumulação de capital alimentar as maiorias trabalhadoras, do que decorre o sempre presente e exuberante número de famintos em todo o globo. Ou seja, a luta pelo direito humano à vida tem menos que ver com a reforma deste sistema e mais que ver com a sua superação.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

AS CIDADES OCULTAS E OS MEGAEVENTOS

Em defesa da democracia ouvimos a mídia repetir sem cansar que Hugo Chaves é um ditador exemplar. Dizem: a população sofre com seus atos, pois quer implantar, de cima para baixo, o Socialismo Bolivariano. Mas poucos jornalistas e intelectuais fazem uma análise crítica do histórico processo de dominação e exploração da classe proletária da Venezuela. E como anda nossa República Democrática? Com as preparações para a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos são previstas obras sem licitação, “remoções” (despejos) de milhares de pessoas, transferências de recursos públicos sem transparência, intervenções que ferem as leis de planejamento urbano e normas de proteção ao ambiente, falta de respeito aos direitos humanos. Não existe participação popular nas decisões! Há, de fato, a presença de um “Estado de Exceção”. Muitas das obras planejadas não respeitam os parâmetros firmados em documentos internacionais e nacionais tais como: o Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, a Constituição Federal de 1988, o Estatuto das Cidades de 2001 e os Planos Diretores. Para o “justo desenvolvimento do Brasil” os dois megaeventos custarão, cada um deles, por enquanto, a cifra de 30 bilhões de reais. Só a empresa Odebrecht, que está à frente da construção da Arena do Corinthians em S. Paulo, Fonte Nova em Salvador, Arena de Pernambuco e a reforma do Maracanã receberá 2,6 bilhões de reais. Na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, o sistema viário passará em cima de proletárias favelas que serão “democraticamente removidas”. A Unidade de Pacificação-corredor quem vem do aeroporto até a Barra da Tijuca- é um verdadeiro “cordão sanitário” contra a pobreza, a geografia corresponde às áreas dos projetos dos megaeventos. Como se os moradores fossem “entulhos humanos” o prefeito pretende “remover” apenas 119 favelas. A antiga Comunidade Vila do Autódromo, localizada próxima ao local de construção da Vila Olímpica, também está ameaçada de “remoção”. Para a implantação do Veículo Leve sobre Trilhos e a urbanização do Rio Cocó, na cidade de Fortaleza, estão previstas a “remoção” de 3.500 famílias e mais de 3.800 favelas. Muita “Gente Humilde” está sendo expulsa das cidades e dos estádios com apoio do Estado Democrático e com o uso de fundos públicos. A reforma do Maracanã diminuirá em quase 10 mil o número de torcedores, haverá um shopping com praça de alimentação. Lembremos que nos Pan-Americanos de 2007, foi feito um contrato exclusivo com uma rede de fast-food e os torcedores não podiam levar seus lanches. As 12 cidades são vitrines mercadológicas para o capital, portanto devem ocultar “tudo que é feio” para o “inglês não ver”. E o proletariado, em sua maioria negro e pardo, será “removido”, mais uma vez, pela classe dominante racista do Brasil. Por que “te calas” imprensa livre? Salve Adoniran! Salve Chico!(Caros Amigos, 1/2011)


Felipe Luiz Gomes e Silva felipeluizgomes@terra.com.br

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

O Egipto à beira do sangue

por Thierry Meyssan [*]

.De há uma semana a esta parte os meios de comunicação ocidentais fazem-se eco das manifestações e da repressão que agitam as grandes cidades egípcias. Traçam um paralelo com as que levaram ao derrube de Zine el-Abidine Ben Ali na Tunísia e evocam um vendaval de revolta no mundo árabe. Segundo eles, este movimento podia estender-se à Líbia e à Síria. Devia favorecer os democratas laicos e não os islamitas, prosseguem eles, porque a influência dos religiosos foi sobrestimada pela administração Bush e o "regime dos molllah" no Irão é um dissuasor. Assim se concretizariam os votos de Barack Obama na Universidade do Cairo: a democracia reinará no Próximo Oriente.

Esta análise é falsa segundo todas as perspectivas.

  • Primeiro, as manifestações começaram no Egipto já há alguns meses. Os meios de comunicação ocidentais não lhes prestaram atenção porque pensavam que elas não levariam a nada. Os egípcios não foram contaminados pelos tunisinos, mas foram os tunisinos que abriram os olhos dos ocidentais sobre o que se passa naquela região.

  • Em segundo lugar, os tunisinos revoltaram-se contra um governo e uma administração corruptos que foram espoliando gradualmente toda a sociedade, privando de qualquer esperança classes sociais cada vez mais numerosas. A revolta egípcia não é dirigida contra esse modo de exploração, mas contra um governo e uma administração que estão tão ocupados em servir os interesses estrangeiros que já não têm energia para satisfazer as necessidades básicas da sua população. No decurso dos últimos anos, o Egipto assistiu a inúmeros motins, quer contra a colaboração com o sionismo, quer provocados pela fome. Estes dois assuntos estão intimamente ligados. Os manifestantes evocam indistintamente os acordos de Camp David, o bloqueio a Gaza, os direitos do Egipto às águas do Nilo, a partilha do Sudão, a crise de habitação, o desemprego, a injustiça e a pobreza.

    Além disso, a Tunísia era administrada por um regime policial, enquanto que o Egipto é-o por um regime militar. Digo aqui 'administrado' – e não 'governado' – porque em ambos os casos, trata-se de Estados sob uma tutela pós-colonialista, privados de política estrangeira e de defesa independente.

    Segue-se que na Tunísia, o exército pôde interpor-se entre o Povo e a polícia do ditador, enquanto que no Egipto, o problema será resolvido pelo fuzil automático entre militares.

  • Em terceiro lugar, se o que se passa na Tunísia e no Egipto serve de encorajamento para todos os povos oprimidos, estes últimos não são os que os meios de comunicação ocidentais imaginam. Para os jornalistas, os maus são os governos que contestam – ou fingem contestar – a política ocidental. Enquanto que para os povos, os tiranos são os que os exploram e humilham. É por isso que penso que não iremos assistir às mesmas revoltas em Damasco. O governo de Bachar el-Assad é o orgulho dos sírios: alinhou do lado da Resistência e soube preservar os seus interesses nacionais sem nunca ceder às pressões. Acima de tudo, soube proteger o país do destino que Washington lhe reservava: ou o caos à moda iraquiana, ou o despotismo religioso à moda saudita. Claro que é muito contestado em muitos aspectos da sua gestão, mas desenvolve uma burguesia e os procedimentos democráticos que a acompanham. Pelo contrário, estados como a Jordânia e o Iémen são instáveis no que se refere ao mundo árabe, e o contágio também pode atingir a África negra, por exemplo o Senegal.

  • Em quarto lugar, os meios de comunicação ocidentais descobrem tarde demais que o perigo islamista é um espantalho. No entanto é preciso reconhecer que foi activado pelos Estados Unidos de Clinton e pela França de Miterrand nos anos 90 na Argélia, e depois foi exagerado pela administração Bush na sequência dos atentados de 11 de Setembro, e alimentado pelos governos neo-conservadores europeus de Blair, Merkel e Sarkozy.

    Também é preciso reconhecer que não há nada em comum entre o wahhabismo à saudita e a Revolução islâmica de Rouhollah Khomeiny. Qualificá-los a ambos de 'islamitas' não só é absurdo como é impedir que se compreenda o que se está a passar.

    Os Seoud financiaram, de acordo com os Estados Unidos, grupos muçulmanos sectários que defendem o regresso à imagem que têm da sociedade do século VII, no tempo do profeta Maomé. Já não têm mais impacto no mundo árabe do que têm os amish nos Estados Unidos, com as suas carroças puxadas a cavalos.

    A Revolução de Khomeiny não pretende instaurar uma sociedade religiosa perfeita, mas derrubar o sistema de dominação mundial. Afirma que a acção política é um meio para o homem se sacrificar e se transcender e, por conseguinte, que é possível encontrar no Islão a energia necessária à mudança.

    Os povos do Próximo Oriente não querem substituir as ditaduras policiais ou militares que os esmagam por ditaduras religiosas. Não há perigo islamita. Simultaneamente, o ideal revolucionário islâmico que já produziu o Hezbollah na comunidade xiita libanesa, influencia agora o Hamas na comunidade sunita palestina. Pode de facto desempenhar um papel nos movimentos em curso, e já o desempenha no Egipto.

  • Em quinto lugar, por muito que desagrade a certos observadores, apesar de assistirmos a um regresso da questão social, este movimento não pode ser reduzido a uma simples luta de classes. É verdade que as classes dominantes receiam as revoluções populares, mas as coisas são mais complicadas. Assim, sem surpresas, o rei Abdallah da Arábia Saudita telefonou ao presidente Obama para lhe pedir que faça parar a desordem no Egipto e proteja os governos existentes na região, prioritariamente o seu. Mas este mesmo rei Abdallah acaba de favorecer uma mudança de regime no Líbano pela via democrática. Abandonou o multimilionário líbano-saudita Saad Hariri e apoiou a coligação de 8-Março, Hezbollah incluído, para o substituir como primeiro-ministro por um outro multimilionário líbano-saudita Najib Mikati. Hariri tinha sido eleito por parlamentares que representavam 45% do eleitorado, enquanto que Mikati acaba de ser eleito por parlamentares representando 70% do eleitorado. Hariri estava enfeudado a Paris e a Washingtom, Mikati anuncia uma política de apoio à Resistência nacional. A questão da luta contra o projecto sionista é actualmente superdeterminante em relação aos interesses de classe. Além disso, mais do que a distribuição da riqueza, os manifestantes põem em causa o sistema capitalista pseudoliberal imposto pelos sionistas.

  • Em sexto lugar, para voltar ao caso egípcio, os meios de comunicação ocidentais lançaram-se em volta de Mohamed ElBaradei que designaram por líder da oposição. É ridículo. M. ElBaradei é uma personalidade com uma reputação simpática na Europa, porque resistiu algum tempo à administração Bush, sem se lhe opor totalmente. Personifica pois a boa consciência europeia face ao Iraque, que se opunha à guerra e acabou por apoiar a ocupação. No entanto, objectivamente, M. ElBaradei é a água morna que recebeu o Prémio Nobel da Paz para que Hans Blix não o recebesse. É sobretudo uma personalidade sem qualquer eco no seu próprio país. Não existe politicamente a não ser porque a Irmandade Muçulmana o escolheu para seu porta-voz nos meios de comunicação ocidental.

    Os Estados Unidos fabricaram adversários mais representativos, como Ayman Nour, que não tarda muito vai ser tirado do chapéu, apesar de as suas posições a favor do pseudo-liberalismo económico o desqualificarem perante a crise social que o país atravessa.

    Como quer que seja, na realidade, só existem duas organizações de massas, implantadas na população, que há muito se opõem à política actual: a Irmandade Muçulmana, por um lado, e a Igreja cristã copta, por outro lado, (apesar de S.B. Chenoudda III distinguir a política sionista de Mubarak que ele combate, do rais [1] com que se entende). Este ponto escapou aos meios de comunicação ocidentais porque fizeram crer há pouco tempo ao público que os coptas estavam a ser perseguidos pelos muçulmanos quando estavam a ser perseguidos pela ditadura de Mubarak.

    Mubarak e Suleiman.Aqui torna-se útil um parêntesis: Hosni Mubarak acaba de nomear Omar Suleiman para vice-presidente. É um gesto claro que pretende tornar mais difícil a sua eventual eliminação física pelos Estados Unidos. Mubarak chegou a presidente porque tinha sido designado vice-presidente e os Estados Unidos mandaram assassinar o presidente Anuar el-Sadate pelo grupo de Ayman al-Zawahri. Portanto, sempre se recusou até agora a arranjar um vice-presidente com medo de ser assassinado por sua vez. Ao designar o general Suleiman, escolheu um dos seus cúmplices com quem manchou as mãos no sangue de Sadate. A partir de agora, para conquistar o poder, não bastará matar apenas o presidente, será preciso executar também o seu vice-presidente. Ora, Omar Suuleiman é o principal artífice da colaboração com Israel. Washington e Londres vão pois protegê-lo como às meninas dos seus olhos.

    Além do mais, Suleiman pode apoiar-se em Tsahal [2] contra a Casa Branca. Já começou por chamar atiradores de elite e material israelwnses que estão prontos para matar os cabecilhas da multidão.

    O general-presidente Hosni Mubarak e o seu general-vice-presidente Omar Suleiman apareceram na televisão com os seus generais conselheiros para dar a entender que o exército tem o poder e vai mantê-lo.

  • Em sétimo lugar, a situação actual revela as contradições da administração americana. Barack Obama estendeu a mão aos muçulmanos e apelou à democracia aquando do seu discurso na universidade do Cairo. No entanto, agora, vai utilizar todo o seu empenho para impedir eleições democráticas no Egipto. Se pode aceitar um governo legítimo na Tunísia, não pode fazê-lo no Egipto. As eleições beneficiariam a Irmandade Muçulmana e os coptas. Escolheriam um governo que abriria a fronteira de Gaza e libertaria o milhão de pessoas que lá estão encerradas. Os palestinos, apoiados pelos seus vizinhos, o Líbano, a Síria e o Egipto, derrubariam o jugo sionista.

    É preciso assinalar aqui que, no decurso dos dois últimos anos, estrategas israelenses conceberam um golpe retorcido. Considerando que o Egipto é uma bomba social, que a revolução é inevitável e está iminente, conceberam favorecer um golpe de estado militar em benefício de um oficial ambicioso e incompetente. Este lançaria uma guerra contra Israel e seria vencido. Tel-Aviv poderia assim reencontrar o seu prestígio militar e recuperar o monte Sinai e as suas riquezas naturais. Sabe-se que Washington se opôs decididamente a este cenário demasiado difícil de controlar.

    O que é certo é que o Império anglo-saxão se mantém agarrado aos princípios que fixou em 1945: é favorável às democracias que fazem uma 'boa escolha' (a do servilismo), e opõe-se aos povos que fazem a 'má escolha' (a da independência).

    Por conseguinte, se acharem necessário, Washington e Londres apoiarão sem reservas um banho de sangue no Egipto, desde que o militar que levar a melhor se comprometa a perpetuar o statu quo internacional.

31/Janeiro/2011
NT
[1] Rais: título usado pelos dirigentes de estados muçulmanos na Índia, no Médio Oriente e na Ásia do Sul.
[2] Tsahal: nome dado às forças armadas de Israel.

  • Imagens do Egipto em http://totallycoolpix.com/2011/01/the-egypt-protests/

    [*] Analista político francês, presidente-fundador do Réseau Voltaire da conferência Axis for Peace . Publica toda semana crónicas de política estrangeira na imprensa árabe e russa. Última obra publicada:L'Effroyable imposture 2 , éd. JP Bertand (2007).

    O original encontra-se em http://www.voltairenet.org/article168311.html . . Tradução de Margarida Ferreira.


    Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
  • Nova turma da pós em Gestão Pública e Sociedade


    Nota informativa:

    A 3º edição do curso de especialização em Gestão Pública e Sociedade será ofertado por meio de uma parceria entre a UFT/Unicamp, viabilizada com um termo de convênio, já assinado, com a Secretaria Nacional de Economia Solidária.

    Logo, este curso terá o foco em formar "especialistas em políticas públicas para a economia solidária".

    No momento, estamos aguardando a liberação de recursos, para publicar o edital de abertura.

    Os interessados poderão pedir "cadastro para aviso" no seguinte endereço: posgestaopublica@uft.edu.br que, assim que tiver sido lançado o edital, avisamos via e-mail.

    Atenciosamente

    A coordenação