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Página específica para a 3ª edição do curso de especialização em Gestão Pública e Sociedade:

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Economia Solidária: Reformar ou Revolucionar?

Recebi hoje notícia que o marco jurídico da chamada "economia solidária" está em revisão, ou seja, a lei do cooperativismo está em reforma. Tendo em vista o louvável esforço de muitos de "incluir" seres humanos no sistema econômico, buscando condições minimas de almejar uma renda digna, fato que respeito, também em respeito a esses mesmos seres humanos, em respeito ao nosso bom senso, a todo o conhecimento e debate acumulado, e especialmente a luta histórica, necessária, que pertence a toda a espécie humana, por emancipação social, novamente questiono alguns pontos:

1 - Por que os gestores, pensadores, especialistas, etc, da economia solidária não conseguem, ou mesmo evitam, debater questões estruturais?

2 - Por que muitos insistem em "incubar" seus semelhantes, dentro de uma proposta (burocrática, pois é de "cima para baixo") que nem eles mesmos acreditam, ou seja, os gestores, formentadores, etc, continuam com seus salários consideráveis, financiados pelo Estado, e querem impor aos demais o empreendedorismo (que é ainda a produção de mercadorias, valor de troca, etc, subordinados ao mercado monopolizado por poucos), isso é desconhecimento? Sadismo? Até hoje eu não vi ninguém (talvez haja raras exceções), abandonar seu cargo estável, seu escritório, para ir catar lixo...

Depois dessas provocações, espero que a mente esteja aberta a alguns reflexões, se não, peço desculpas pelo delírio ou atrevimento.

Olhem só que situação a proposta de economia solidária está hoje, depois de anos e anos de experimentos, estudos, debates, lutas... Lutas estas que devemos incluir a própria origem do movimento cooperativista, que data a mais de 150 anos... depois de tudo, que avanço estrutural e qualitativo houve? Os seres humanos estão superando sua condição de trabalhadores aliendados e subordinados ao capital para a condição de produtores livres e emancipados? Há alguns sinal disso?

Ou será que temos ainda a mesma perspectiva / prática, ou seja, criar/fomentar grupos esparsos, isolados, ilhas cercadas pela mercado do capital (valor de troca, mais valia, gestão burocrática dos meios de reprodução social, como educaçao, tecnologia, etc)... a multiplicação de tais grupos muda ou está mudando o sistema hegemônico? Está, ao menos, se reformando nosso sistema econômico e social? É o reformismo do pleno emprego, bons salários, educação e saude universais e de qualidade? Ainda é possivel, no atual estágio histórico do capital, eminentemente financeiro e destruidor, reformar o capitalismo?

Claro que muitas iniciativas são reações de sobrevivência, legítimas, necessárias, frente a lógica despótica de acumulação privada da riqueza social...

Porém, já temos, por todos os lados, os "sinais", os "fatos", as "declarações", de muitas pessoas envolvidas nos seus empreendimentos, nas suas estratégias de sobrevivências, que declaram que isso não é suficiente, que não ter a liberdade de determinar sua jornada de trabalho, seu nivel de renda (ou seja, autogestão social efetiva)... enquanto isso, os que se auto-intitulam gestores e pensadores/intelectuais da economia solidária não fazem essa leitura, não escutam, trabalham no idealismo puro, se apoiando nos velhos "casos de sucesso"... quero lembrar ainda que outros seres humanos, que por algum motivo ou razão conseguiram ter instrução, formação, etc, fazem e fizerem criticas profundas para superar tal estado as coisas, especialmente nas correntes de pensamentos da teoria crítica ou do materialismo histórico... mas só os gestores amesquinham tal processo histório (de reação, reflexão, projeto, tentativas, experimentos, reflexão, prática, projetos, debates, conhecimento...) e dialética constante, e congelam tudo numa unica alternativa ou estratégia, qual seja, a de fomentar/incubar mais e mais cooperativas e associações, buscando grupos que tenham "sucesso", que sejam "competitivos"...

Observem a preocupaçao atual nos "espaços oficiais" da economia solidária:

1) reformar o marco jurídico;

2) poder iniciar uma cooperativa com 7 associados;


Pasmem!

O movimento, não sei se pelo equivoco das suas lideranças ou por uma confusão geral, se inverteu completamente. É como se existissem microcosmos, milhares de "economias solidárias", que começam com 20 elementos (e agora com 7) e vão tocando como podem sua história particular, privada...alheios e passivos ao mundo que os rodeia...

Ora, porque não pensar em um organismo econômico/social que aglutine 100 milhões de produtores?? Impossível? Claro que será imponderável enquanto muitas mentes continuarem presas a sedução/amor ao dinheiro, enquanto nossas referências forem as mesmas de sempre: o empreender/ o eficiente, rentabilidade, capital acumulado, vendas, oferta, demanta, competitividade, crédito, regras/leis, redes/parcerias, políticas públicas de fomento, propriedade privada dos grupos, marco jurídico da economisa solidária, lei do cooperativimo, até lei da autogestão (sic), que é um conceito/referência oposto a lógica de dominação racional/legal, temos em pauta!

Como muito bem escreveu recentemente Frei Betto, no correio da cidadania, vivemos sobre a sombra de um "apocalipse agora", isso porque a combinação de muitos desses elementos levam a acumulação sem limites, que se traduz tanto na luta por dominar mercados e diminuir a massa salarial (automação, desemprego estrutural, crise financeira), como também na produção (dominada/determinada) de superfluos, desperdício, logo, destruição incessante, irracional, suicída, dos meios e sistemas ecológicos (natureza), de suporte a vida...

O foco de "reformar" ou "melhorar" a economia solidária é muito restrito, pois uma das prioridades buscadas são tão somente ajustes no marco jurídico/legal da economia solidária/cooperativas.

Não está em discussão estrutura/sistema econômico, reprodução social, dinâmicas sócio-metabólicas, qualidade tecnológica, riqueza social, fluxos ecológicos, etc...

Logo, a idéia inicial, que atraiu muitos personagens, pensadores, militantes, inclusive eu, de que a proposta de economia solidária é um meio, uma estratégia, fundada e estruturada na esfera produtiva, de superação do capital, tal idéia vem se transformando em promessa, em discurso, que precisa de muita emoção, pois tem pouco conteúdo e fundamento...

Por isso quase ninguém leva em conta outras chaves metodológicas e referências de análise e práxis, tais como: valor trabalho, valor de uso, trabalho disponível, propriedade orgânica, riqueza social, tempo livre, estoque tecnológico, tecnologia social, tecnologias ecológicas, controle democrática, autogestão social, instituições de coordenação, renda sistemica/conjunta/integrada, sistema integrado/orgânico/horizontal, comunicação e produção do conhecimentos como bens públicos, superação da lógica burocrática de gestão nas organizações, etc, etc...


Enfim, com todo o respeito e expressando desculpas por palavras que venham, por ventura, a ofender alguém, declaro minha tristeza e decepção por tamanho descompasso entre os imperativos históricos (ou mesmo a urgente necessidade de superar o estabelecido), e a banalidade e superficialidade como são tratadas as alternativas e meios de enfrentamento.


Abraços libertários

Édi Benini - Palmas/TO

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